Temas quentes na reunião da ICANN, órgão que cuida da raiz de nomes da Internet, em Porto Rico, um Estado associado aos Estados Unidos, incluíram discussão sobre os efeitos da GDPR europeia (regulação geral para proteção de dados) que, potencialmente, pode estender seus braços para além das fronteiras físicas da Europa, em mais um caso de possível jurisdição extraterritorial.
A intenção da GDPR é altamente positiva e elogiável: proteger o que nos resta de privacidade. Há o risco de “leituras particulares”, expandidas a gosto do eventual oportunismo em monetarizar nossas informações ou criar censura indireta, que podem ameaçar o precário balanço entre transparência, responsabilidade e privacidade.
Há muitos lobos em peles de cordeiro espreitando por aí e, convenhamos, a expansão rápida da rede provê levas de vítimas, novos usuários incautos à mercê de aproveitadores.
Mas falemos da algo mais divertido, porém não menos emblemático: há uma proposta de uso de emojis como identificadores! Na pré-história da rede (há uns 10 anos) usava-se o alfabeto latino nos identificadores: nomes de domínio, endereço de correio eletrônico, páginas na rede. O conteúdo, sim, podia ser escrito em idiomas diversos,como cirílico, japonês ou grego; mas não os identificadores.
Uma analogia seria com o velho correio: os dados do envelope (endereço, país) sempre em caracteres latinos e, mais precisamente, em francês. Um operador local de correio não precisaria entender todos os idiomas do mundo para encaminhar uma carta. Imagine-se uma agência de correio brasileira que recebesse uma carta com o endereço do destinatário em árabe: como decidir para onde enviar? A máquina facilitou o “aggiornamento” do sistema e hoje existem os IDN (nomes de domínio internacionalizados) que admitem o uso de diversos conjuntos de caracteres. Posso escrever “estadão.com.br” e chegarei em seu sítio.
A implementação do IDN exigiu ação rápida da comunidade técnica, para ter uma solução que não afetasse a compatibilidade com tudo o que já existia: o uso do Unicode, padrão que engloba caracteres da várias línguas do mundo.
Abriu-se um horizonte à criatividade. E se usarmos caracteres semi-gráficos não incluidos em alfabetos? Que tal emojis? Seria uma boa e lucrativa ideia ofertar nomes de identificadores que incluam emojis no meio da cadeia.
O diabo mora nos detalhes: afinal identificador deve ser algo unívoco. Enquanto um “A” é sempre um “A”, seja minúsculo, verde, itálico, em qualquer fonte, não há a mesma constância num emoji com a diversidade de implementação nas plataformas, e seriíssimos riscos de confusão, sem falar o que se perde em acessibilidade.
Afinal, como contar a alguém meu endereço se nele há uma caretinha risonha? O risco, que já havia com caracteres latinos, onde um “i” maiúsculo pode parecer um “1”, piorou com o IDN, e chegaria às raias do intratável se emojis fossem incorporados.
Imaginem as fraudes possíveis se a identificação de meu remetente depender do tipo de “risadinha” ou do “tom de pele” do emoji que chegou? O SSAC, grupo técnico que cuida disso, recomendou fortemente que não se abrisse mais essa caixa de Pandora. Bastam as já escancaradas.
A intenção da GDPR é altamente positiva e elogiável: proteger o que nos resta de privacidade. Há o risco de “leituras particulares”, expandidas a gosto do eventual oportunismo em monetarizar nossas informações ou criar censura indireta, que podem ameaçar o precário balanço entre transparência, responsabilidade e privacidade.
Há muitos lobos em peles de cordeiro espreitando por aí e, convenhamos, a expansão rápida da rede provê levas de vítimas, novos usuários incautos à mercê de aproveitadores.
Mas falemos da algo mais divertido, porém não menos emblemático: há uma proposta de uso de emojis como identificadores! Na pré-história da rede (há uns 10 anos) usava-se o alfabeto latino nos identificadores: nomes de domínio, endereço de correio eletrônico, páginas na rede. O conteúdo, sim, podia ser escrito em idiomas diversos,como cirílico, japonês ou grego; mas não os identificadores.
Uma analogia seria com o velho correio: os dados do envelope (endereço, país) sempre em caracteres latinos e, mais precisamente, em francês. Um operador local de correio não precisaria entender todos os idiomas do mundo para encaminhar uma carta. Imagine-se uma agência de correio brasileira que recebesse uma carta com o endereço do destinatário em árabe: como decidir para onde enviar? A máquina facilitou o “aggiornamento” do sistema e hoje existem os IDN (nomes de domínio internacionalizados) que admitem o uso de diversos conjuntos de caracteres. Posso escrever “estadão.com.br” e chegarei em seu sítio.
A implementação do IDN exigiu ação rápida da comunidade técnica, para ter uma solução que não afetasse a compatibilidade com tudo o que já existia: o uso do Unicode, padrão que engloba caracteres da várias línguas do mundo.
Abriu-se um horizonte à criatividade. E se usarmos caracteres semi-gráficos não incluidos em alfabetos? Que tal emojis? Seria uma boa e lucrativa ideia ofertar nomes de identificadores que incluam emojis no meio da cadeia.
O diabo mora nos detalhes: afinal identificador deve ser algo unívoco. Enquanto um “A” é sempre um “A”, seja minúsculo, verde, itálico, em qualquer fonte, não há a mesma constância num emoji com a diversidade de implementação nas plataformas, e seriíssimos riscos de confusão, sem falar o que se perde em acessibilidade.
Afinal, como contar a alguém meu endereço se nele há uma caretinha risonha? O risco, que já havia com caracteres latinos, onde um “i” maiúsculo pode parecer um “1”, piorou com o IDN, e chegaria às raias do intratável se emojis fossem incorporados.
Imaginem as fraudes possíveis se a identificação de meu remetente depender do tipo de “risadinha” ou do “tom de pele” do emoji que chegou? O SSAC, grupo técnico que cuida disso, recomendou fortemente que não se abrisse mais essa caixa de Pandora. Bastam as já escancaradas.
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https://link.estadao.com.br/noticias/geral,desgraca-pouca-e-bobagem,70002234121
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