terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Os dragões de 2025

Graças ao papa Gregório XIII, com a reforma do calendário em 1582, estamos terminando 2024, um ano bissexto, também resultante do ajuste. Tudo isso cerca de um século depois do que consideramos o fim da Idade Média, com a queda de Constantinopla em 1453.

Nos mapas medievais, quando se saía da região conhecida, havia um alerta aos navegantes sob a forma de desenhos de dragões e monstros marinhos, às vezes acompanhado da frase "Hic sunt dracones". “Aqui há dragões!, se quer ir além do já mapeado, siga por sua conta e risco”. Mais que um alerta, talvez fosse um desafio: um convite aos temerários que ousássem enfrentar o desconhecido. Sabemos que muito do que desfrutamos hoje se deveu à audácia dos que aceitaram ver-se frente a frente com os tais dragões.

Um dos “dragões tecnológicos” mais óbvios de 2024, foi a Inteligência Artificial, que passou de ferramenta a pleno ambiente. Não apenas ela provou seu controle amplo da linguagem, português incluído, como manteve com os usuários uma interlocução bastante crível, que aparenta razoabilidade e sensatez. É fácil constatar o grau de surpresa de um neófito ao conversar com versões avançadas de LLM, que não apenas respondem às suas perguntas, mas passam a auxiliares importantes (e eventualmente perigosos…) na tomada de decisões. O aprofundamento dessa interação poderá fazer com que, em curto tempo, tenhamos até dificuldade em definir “humano”, ou “consciência”. O velho crivo que Alan Turing propôs em 1949, com o seu teste, é hoje claramente insuficiente para diferençar o humano da máquina.

Em campos como apoio a diagnósticos em medicina, consultas à jurisprudência, aumento da eficácia de processos, a IA, através do aprendizado de máquina e do processamento de imagem e texto, muitas vezes supera os resultados hoje obteníveis por humanos, especialmente quanto se trata de digerir imensas quantidades de dados.

Outra analogia possível é com o mito da Caixa de Pandora. A tecnologia, com IA e novas ferramentas, abriu a tal caixa. Dentro dela pode haver maravilhas, cura de doenças, acesso ainda mais amplo a conhecimento, otimização de recursos e, até, criação sintética de imagens e vídeos. Mas saem também estorvos, como o aumento da desinformação usando IA, a criação sintética de “realidades”, a vigilância ubíqua sob o controle dos poucos que dominam o ferramental, o aumento de desigualdade que qualquer tecnologia usualmente produz, os novos dilemas morais e éticos. Como no mito, restará sempre oculta, no fundo da caixa, a “esperança” à qual nos aferraremos. Afinal, uma vez aberta, a caixa não se fechará novamente.

"Hic sunt dracones" assim, além de um aviso, é um chamado à exploração responsável e ética dos artefatos que estamos criando, na esperança de usá-los para curar e progredir, … sem nos perdermos dos valores humanos. Domemos os dragões que surgirem, aprendamos com eles, e não seremos vítimas de seu hálito mefítico.

Essa navegação perigosa seguirá cada vez mais acelerada em 2025. Que seja um ano propício à humanidade e nos traga boas surpresas!. Até o ano que vem… e com os 150 anos do Estadão!.

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https://pt.wikipedia.org/wiki/Hic_sunt_dracones




Um dos mapas de aproximadamente 1510 é Globo de Lenox. Nele há a frase citada
"Hic Sunt Dracones", próxima à costa leste da Ásia:
https://en.wikipedia.org/wiki/Hunt%E2%80%93Lenox_Globe

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sobre a caixa de Pandora:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Caixa_de_Pandora

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

O Dono da Chave


Estamos em meio à discussão sobre o Marco Civil, com polarizações que nem sempre levam em conta conceitos básicos. Como exemplo, a necessidade de definição de “intermediário”, sem a qual podem ser baldados esforços de convergência. Um ponto simples: o “intermediário” deve saber do conteúdo que transporta? A resposta clássica seria “não”. Em contos como “Miguel Strogoff, o correio do Czar”, de J. Verne, o carteiro faz das tripas coração para levar o envelope ao destino. Telefonia e correios ainda hoje trazem essa vedação, agora com o suporte de uma agência de proteção a dados pessoais e ao sigilo. O conceito é antigo: o histórico lema do correio americano reza que “nem a chuva, nem o sol, ou a nevasca impedirão o carteiro…”, e parece ter sua origem em Homero.Hoje há muitos atores que não se encaixam na definição clássica acima, mas isso não significa que os primeiros desapareceram. O risco é o inverso: na avidez de querer “proteger” a comunidade, há tendências de não mais vedar ao intermediário o conhecimento do que transporta. Aliás, estimula-se que entre ativamente no circuito, decidindo o que deve permitir, ou não. Não se pretende aqui examinar a plêiade de diferentes atores e papéis que existem, mas apenas preservar o que nos resta de privacidade. E a ferramenta que nos dá alguma proteção ainda é a criptografia forte, sem esquecermos que a tecnologia, alvo móvel, em sua incorporação do quântico, pode enfraquecer seriamente processos criptográficos antes seguros.

A boa notícia é que, recentemente, notou-se uma reversão na gana de agências de diversos países – notadamente os que compõem os “cinco olhos”, EUA, Inglaterra, Canadá, Nova Zelândia e Austrália – na busca do acesso às chaves criptográficas, via uma “porta dos fundos”. Em um documento conjunto, “Enhanced Visibility and Hardening Guidance for Communications Infrastructure”, apontam riscos de que outros países, abusando da tal “porta dos fundos”, comprometam em larga escala as redes de comunicação. O relatório recomenda que cidadãos e organizações evitem comunicações em texto aberto, e incentiva o uso de criptografia forte. Se antes esses países buscavam formas de quebrar sistemas de criptografia justificando a prática como “algo essencial para a aplicação da lei e o combate ao crime”, recentes ataques de espionagem, como a operação "Volt Typhoon", expuseram os riscos inerentes à criação de vulnerabilidades propositais nos sistemas.

O uso de TLS, Segurança na Camada de Transporte, tem sido a aplicação mais utilizada de criptografia, e é essencial no uso seguro de redes públicas. Se antes os governos citados resistiam à aplicação aberta da criptografia - ela aumentaria seus custos na aplicação da lei - a nova orientação representa uma guinada em favor da segurança e da privacidade. Mantenhamos o otimismo!

(como curiosidade em criptografia resistente, há o manuscrito Voynich, que desafia especialistas há mais de 500 anos. Jorge Stolfi, professor na Unicamp, é renomado pesquisador do Voynich)

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O texto citado:
https://www.cisa.gov/resources-tools/resources/enhanced-visibility-and-hardening-guidance-communications-infrastructur

Intelligence and Cybersecurity Agencies Urge Use of Encrypted Communications(December 4 & 5, 2024)
Cybersecurity and intelligence agencies from Australia, Canada, New Zealand, and the US have jointly published Enhanced Visibility and Hardening Guidance for Communications Infrastructure. The document serves to underscore the threat posed by Chinese state-sponsored threat actors who have compromised telecommunications networks. The guidance notes that “although [it is] tailored to network defenders and engineers of communications infrastructure, this guide may also apply to organizations with on-premises enterprise equipment.” The US Cybersecurity and Infrastructure Security Agency (CISA) and the FBI have also advised US citizens to avoid using plain text communication channels, recommending encrypted phone and messaging apps "prevent[ing] anyone -- including the app makers -- from accessing the communications of its users."


Editor's Note
[Ullrich] It’s kind of ironic that agencies who lobbied in the past against encrypted communications realize now that the surveillance mechanisms they built into telecom networks are being used against them. This “Volt Typhoon” compromise of multiple telecommunications providers (even outside the US) is the best argument for strong end-to-end encryption.


[Pescatore] Lack of end-to-end encryption of email and attachments still increases overall risk more than this issue. But ideally the publicity around this issue and China’s ease of compromising the major telecom carriers will give politicians the courage to pass badly needed legislation to force major improvements in security at all telecoms and messaging providers – which is needed if email is ever to become safe and trustable. Historical note: logins over the Internet were originally in the clear. In the early 1990s, telecoms providers were routinely compromised with network sniffers that harvested bulk account names and passwords. The growth of the World Wide Web and browsers raised the stakes, and in 1994 Netscape introduced SSL and the US Government released FIPS 140-1 standards for crypto. Finally, in 2001 or so, the US government required all web browsers and servers procured to be FIPS 140 compliant – SSL use for transport security exploded across all industries.


[Murray] Transport Layer Security (TLS) has been the most widespread application of encryption. It is essential to the safe use of public networks. Governments, including the so-called "five eyes" nations have historically resisted the more widespread application of encryption because it raises the cost of law enforcement. This guidance represents a change in favor of national security at the expense of law enforcement.


[Honan] Let this be a case study to those advocating backdoors into encryption protocols for lawful interception purposes: once you introduce a backdoor you have no guarantee that it will not be abused by various actors.


Read more in:
- www.cisa.gov: Enhanced Visibility and Hardening Guidance for Communications Infrastructure https://www.cisa.gov/resources-tools/resources/enhanced-visibility-and-hardening-guidance-communications-infrastructure
- www.zdnet.com: FBI, CISA urge Americans to use secure messaging apps in wake of massive cyberattack https://www.zdnet.com/article/fbi-cisa-urge-americans-to-use-secure-messaging-apps-in-wake-of-massive-cyberattack/
- www.forbes.com: FBI Warns iPhone And Android Users—Stop Sending Texts https://www.forbes.com/sites/zakdoffman/2024/12/06/fbi-warns-iphone-and-android-users-stop-sending-texts/
- www.helpnetsecurity.com: 8 US telcos compromised, FBI advises Americans to use encrypted communications https://www.helpnetsecurity.com/2024/12/05/us-telcos-compromised-fbi-advises-use-of-encrypted-communications/

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Referência sobre o manuscrito Voynich:
https://revistapesquisa.fapesp.br/o-codigo-voynich/
https://www.ufrgs.br/frontdaciencia/2021/10/25/t12e34-o-manuscrito-voynich/


https://www.nationalgeographic.pt/historia/o-codice-voynich-o-manuscrito-mais-estranho-do-mundo_2944





terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Quem é você?

A tendência é que, cada vez mais, nossos bens estejam depositados em dispositivos virtuais, e não físicamente. O costume de nossos ancestrais, de guardar suas economias no colchão ou no baú, é hoje apenas folclórico e motivo de sorrisos. A contrapartida é que. cada vez mais, precisamos de uma forma segura e clara que garanta nossa identidade junto aos entes virtuais que gerenciam nossas interações, e que armazenam nossos bens. Se não houver garantia de que a transação almejada é realizada estritamente entre as partes legitimamente envolvidas, riscos de golpes aumentam enormemente.

Recomendam os bons procedimentos que se use autenticação com dois fatores. A segurança da nossa identificação ficará bem mais resguardada do que com o uso de uma simples senha, como era comum. Um dos fatores pode ser biométrico: ligado a nossos fatores físicos. A impressão digital era a forma tradicional de identificação biométrica, mas hoje há outras maneiras, como o reconhecimento facial, a identificação pela íris ou pela voz do indivíduo, e até mesmo o DNA. E aí entram em cena novos motivos de preocupação: se já havia alertas para que cuidemos da exposição de nossas impressões digitais, que podem ser mecanicamente recuperadas de objetos manuseados, ou mesmo de fotografia de alta resolução em que a posição dos dedos permita isso, a IA consegue, com bastante eficiência, não apenas fazer reproduções muito fieis de nossa face, como consegue imitar nossa voz, a ponto de burlar os sistemas de autenticação, e já há notícias disso ocorrendo... Com um pouco de treino, e tendo acesso a algumas amostras de nossa fala, obteníveis pela internet, um sistema de IA pode mimetizar nosso timbre e inflexões, de forma conseguir fazer-se passar por nós.

Antes de adotarmos um fator de biometria há que verificar sua solidez e, se for o caso, buscar alternativas de biometria mais segura. O exame da íris, por enquanto, segue seguro, mas nada garante que permanecerá assim. Já DNA, certamente, é seguro porém incômodo e pouco prático, além do risco de vazamento desse dado tão pessoal.

Poderíamos optar por um segundo fator não biométrico: uma chave armazenada fisicamente num dispositivo em nosso poder. Ela pode valer-se de criptografia forte mas, sempre, a segurança acabará umbilicalmente ligada à do dispositivo que a armazena. Há formas eletrônicas que ajudam a guardar com segurança senhas em nossos dispositivos - TPM “trusted plataform module”, um circuito eletrônico, é exemplo delas. Mas a integridade do dispositivo em si, bloqueando-se invasões e monitoramentos, continua aspecto crítico.

O contraponto é que a IA, fator de risco conforme descrito acima, pode ser usada também defensivamente. Ela nos ajudaria a avaliar a solidez das chaves escolhidas, a lembrar da necessidade de rodízio dessas chaves, e detectar eventuais tentativas de acesso aos dispositivos. Se as novas tecnologias trazem ameaças, elas também podem ser ferramentas de proteção. O que não devemos é ignorá-las. Afinal “não devemos ter medo do que vem pela frente… desde que venha pela frente!”

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https://www.estadao.com.br/link/demi-getschko/como-proteger-a-identidade-digital-na-era-das-ias/

Sobre voz humana imitada por IA:
Cloned customer voice beats bank security checks:
https://www.bbc.com/news/articles/c1lg3ded6j9o

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Impressões difitais:
What Is a Fingerprint? Definition, Types, Trends (2024)
https://www.aratek.co/news/what-is-a-fingerprint

Obtendo impressões digitais de outrem, através de fotografias:
Fact-check: Can hackers steal fingerprints from selfies?
https://www.euronews.com/my-europe/2024/04/29/fact-check-can-hackers-steal-fingerprints-from-selfies




terça-feira, 19 de novembro de 2024

Internet em Bizâncio

Em Istambul houve, semana passada, a 81.a reunião da ICANN – entidade que coordena a distribuição global de nomes e números na Internet. São tres reuniões anuais realizadas em rodízio de regiões geográficas, e a última de cada ano é a chamada “reunião geral”. ICANN é uma instituição privada sem fins lucrativos, estabelecida na Califórnia, EUA. Tem como função técnica precípua administrar a “raíz de nomes” da Internet. É nessa “raíz” que se alojam os chamados “domínios de topo”, que formam último “sobrenome” das denominações na rede. Os domínios de topo se dividem em duas famílias com algumas características diferentes: a dos “domínios genéricos” (gTLD), que inclui os populares .com, .net, .org e, por iniciativa da ICANN, já ganhou a adição de mais de 2000 integrantes, e os domínios de código de país (ccTLD), que apresentam-se com duas letras e são cerca de 300: .ar, .br, .ch, .de, etc. A criação de ccTLD precede a da própria ICANN: o .br, por exemplo foi ativado em 1989, e a ICANN consolidada em 1996.

Para se financiar ICANN conta com contribuições, em geral voluntárias, de ccTLD e contribuições definidas em contrato com os gTLD. Assim, a criação de mais gTLD pela própria ICANN, representa também uma forma de a entidade aumentar sua receita. Um aspecto imortante que diferencia gTLD de ccTLD é que, enquanto os gTLD são criados e tem sua forma de funcionar definida através de contrato com ICANN, os ccTLD são sujeitos à legislação local do país em que se encontram. Em favor dos ccTLD pode-se adicionar que, em termos de segurança e como fonte de ataques, eles são mais seguros que os gTLD num fator médio de 5. No caso do .br, por exemplo, são aceitos apenas pedidos de registros com CPF ou CNPJ, e é sempre visível saber quem registrou determinado domínio. Como todos os domínios funcionam igualmente na rede, alguém mal-intencionado provavelmente preferirá registrar sob um gTLD que num ccTLD.

Sendo multissetirial, a ICANN conta também com participação de representantes de governos, num “comitê assessor”, representantes da sociedade civil geral, e representantes de órgãos técnicos relacionados à rede. O tema principal desta reunião foi tratar das providências necessárias e previsões contratuais referentes a uma nova leva de gTLD que será ofertada a interessados. Certamente há muitos pontos de alerta a serem levados em conta, e todos os segmentos envolvidos expressam suas preocupações.

Saindo do tópico, Istambul é uma cidade bem grande, com cerca de 16 milhões da habitantes. Tem longo legado histórico, uma vida fervilhante e se mostra muito segura aos visitantes. Istambul nasceu e foi Bizâncio por mil anos. No ano de 324, reinado de Constantino, for rebatizada Constantinopla, a Nova Roma. Mais 1600 anos se passaram até 1930, quando foi renomeada Istambul. É cheia de monumentos históricos importantes, como a Santa Sofia, construida em 537 para ser a catedral da Nova Roma, e que ainda hoje ostenta seu imponente domo e belos mosaicos. Napoleão teria dito que se o mundo fosse uma única nação, sua capital seria Constantinopla.


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https://meetings.icann.org/en/meetings/icann81/

ICANN81 Annual General Meeting
This six-day Annual General Meeting (AGM) will be focused on showcasing ICANN’s work to a broader global audience, with more time dedicated to capacity building and leadership training sessions. The AGM is also where new members of the ICANN Board of Directors take their seats.
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Santa Sofia (537):
https://en.wikipedia.org/wiki/Hagia_Sophia

Torre Gálata (1348):






terça-feira, 5 de novembro de 2024

Revendo Leis



A tecnologia está exigindo revisitas frequentes à legislação que temos, em busca de desacelerar os abusos, seja com lenitivos aos ofendidos, seja com punições adequadas aos ofensores. Do ponto de vista pouco sofisticado de um engenheiro, há princípios que devem ser resguardados ao máximo, e deve-se evitar o risco de soluções simplistas, apenas porque estão “à mão”. Aliás, do próprio decálogo que o CGI publicou em 2009, lemos: “O combate a ilícitos na rede deve atingir os responsáveis finais e não os meios de acesso e transporte, sempre preservando os princípios maiores de defesa da liberdade, da privacidade e do respeito aos direitos humanos”. Em grego, remédio e veneno tem a mesma raiz, “fármaco”. A dosagem definirá se sua ação é positiva ou deletéria. Em português “droga” tem a mesma dualidade.

Se a Internet já nos trouxe complicações de monta nessa área, a coisa tende a piorar sensivelmente com a expansão de Inteligência Artificial. Tanto Internet, como IA e o mundo digital em sua expansão, proveram ao cidadão e às empresas um poder inaudito: o de participar ativamente, seja ao exprimir suas opiniões e posições, seja usando IA para seu apoio e eventuais decisões. Em IA a discussão é mais complexa, pelos riscos muitos vezes ignorados que seu uso pode acarretar. Ela é mais que uma simples “ferramenta” e, ainda assim, seu uso legítimo e correto está mais ligado ao que os usuários fazem, do que a eventuais problemas e viéses que ela pode embutir.

Lemos recentemente, por exemplo, que houve um suicídio de um jovem, ao que se diz causado por desenganos em seu relacionamento com avatar de IA. Quem seria responsabilizável por isso? Aparentemente, tenta-se atribuir ao fornecedor da IA os danos emocionais causados. E esse não é um caso novo: quando Goethe escreveu “Os Sofrimentos do Jovem Werther”, em 1774, houve uma onda de suicídios na Europa, suscitados pelo próprio fim que Werther pos à sua vida, na impossibilidade de realizar seu amor. Ora, não creio que Goethe tenha sido responsabilizado pelo romance ou, menos ainda, a editora que publicou o livro. Claro que é necessário cuidado nos efeitos que uma obra pode causar, e eles podem ser mitigados estabelecendo adequada orientação de leitura adequada para cada idade. Afinal, como as obras do Marques de Sade exemplificam, há obras bem complexas e polêmicas,

Outro caso recente relata abuso virtual, que também levou ao suicídio de uma adolescente. O criminoso no caso, sem nunca ter encontrado a vítima em pessoa, foi condenado a prisão perpétua na Irlanda. Certamente a forma que ele usou é abjeta, e ele, ao que consta, a repetiu com mais de 3000 adolescentes em diferentes países. Claro que isso só foi possível porque a rede dá essa flexibilidade de acesso. Como minimizar esses riscos? Numa analogia com o mundo real, um adolescente numa biblioteca física podia buscar Dom Casmurro, de Machado de Assis, ou “Os 120 Dias de Sodoma”, de Sade. Se, na biblioteca, pode-se sinalizar as prateleiras, isso fica mais difícil na Internet global. De novo, a diferença entre remédio e veneno é apenas a dose...

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"Os sofrimentos do jovem Werther":

https://pt.wikipedia.org/wiki/Os_Sofrimentos_do_Jovem_Werther

e, em bela versão operística:
https://www.youtube.com/watch?v=p90HEtK1Bi0

a ária mais conhecida:
https://www.youtube.com/watch?v=UmYSKZpbSHY
https://www.youtube.com/watch?v=PzKhikZ4oVE
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Textos de Barlow:

(John Perry Barlow – The Economy of Mind - "Vendendo vinho sem garrafas"

https://www.eff.org/pages/selling-wine-without-bottles-economy-mind-global-net

https://designmanifestos.org/john-perry-barlow-the-economy-of-ideas/

https://www.repository.law.indiana.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=4076&context=facpub

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O caso do abusador condenado:

https://www.theguardian.com/uk-news/2024/oct/25/alexander-mccartney-northern-ireland-man-jailed-for-life-abusing-children-online

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Opinião: Morte de jovem que se apaixonou por IA expõe lacuna legal

https://www.migalhas.com.br/quentes/418449/opiniao-morte-de-jovem-que-se-apaixonou-por-ia-expoe-lacuna-legal

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terça-feira, 22 de outubro de 2024

Aspirando dados

Falou-se nestes dias sobre aspiradores de pó “inteligentes”, que estariam agindo de forma estranha e abusiva. Não apenas recolhendo dados da residência em que operam e enviando-os ao fabricante – o que, de certo modo, era até previsto pelos “termos de uso” que acompanham o equipamento - mas também, após invadidos por terceiros, usarem o altofalante para disparar impropérios e obscenidades… Seria cômico, não fosse preocupante.

De tempos em tempos questões básicas retornam. Há 10 anos, por exemplo, houve um alerta, associado à grande difusão da Internet das Coisas, de que dispositivos caseiros – à época o caso mais difundido era o de câmeras de vigilância domésticas - estariam sendo invadidos por programas maliciosos. Um caso emblemático foi do virus Mirai, que conseguiu montar e controlar um exército de equipamentos “zumbis”.

Há diferentes pontos a considerar aí. Quanto à motivação para captura de dados, a explicação mais plausível hoje é a ligada à Inteligância Artificial, e ao fato de que o “aprendizado de máquina” depende viceralmente da aquisição de grande quantidade de dados, principalmente no ambiente em que atuará. Essa, inclusive, é a explicação embutida nos “termos de uso” do fabricante: para um dispositivo automático ser eficiente e confiável, ele deve reconhecer, com a maior acuidade possível, o ambiente em que se encontra, e o modo de ação que dele se espera. Isso exige, por exemplo, que esses dispositivos permaneçam ligados à Internet. Afinal, e pensando bem, por que um aspirador que está operando numa casa precisaria, indefectivelmente, estar ligado à rede para funcionar? Ao menos por enquanto, outros eletrodomésticos convencionais funcionam sem acesso à rede… A primeira ameaça que presiste, portanto, é a de que dados nossos, inadvertidamente, sejam coletados e enviados ao fabricante, à guisa de “aperfeiçoamento dinâmico do sistema”.

A segunda e mais insidiosa possibilidade vem de que, se existe um caminho de acesso remoto, ele poderá ser explorado por mal-intencionados. Claro que descuidar de senhas, fracas ou antigas, facilita a ação de invasores, mas – e é o que se vê no caso - mesmo com cuidados básicos do usuário, eventuais brechas de segurança do fabricante permitiram o acesso indevido. Alguns invasores, como o Mirai, buscavam manter-se invisíveis até porque seu alvo não era o equipamento em si: eles visavam a objetivos mais gerais. Usando os pontos invadidos como base, o exército do Mirai buscava, com ataque de “negação de serviço” (DoS) tirar do ar serviços importantes. E buscava manter-se invisível. Alguns dos invasores atuais, entretanto, ou buscam nossos dados, ou querem mostrar “competência” e haurir a “fama” do feito. Assim, não hesitam em exibir-se, dirigindo impropérios ao pessoal da casa. Se o aspirador tem altofalante e microfone para poder dialogar com o pessoal de casa, nada impede que se usem para um fim menos digno. E onde há uma “porta”, há sempre um risco de intrusão. A hiperconectividade facilita o abuso de nossa privacidade. Fiquemos atentos!

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Notícias sobre o caso:
- do Bruce Schneier:
https://www.schneier.com/blog/archives/2024/10/deebot-robot-vacuums-are-using-photos-and-audio-to-train-their-ai.html

- do Panda Security

- na Austrália:

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trecho dos "termos de uso" da Ecovacs:
https://gl-us-wap.ecovacs.com/content/agreementNewest/PRIVACY/DEFAULT/DEFAULT
We, Ecovacs Robotics Co., Ltd. (hereinafter referred to as “we”, “us” or “our”) respect and protect your privacy and personal information. This ECOVACS HOME Privacy Policy (hereinafter referred to as this “Policy”) explains the way we process your personal information and the rights you have under this Policy, when you use the ECOVACS HOME App provided by us (hereinafter referred to as the “App”) to control and administer the robotic cleaning device that are connected to your App user account (hereinafter referred to as the “Device”). Being the App operator, we act as the controller of your personal data which we will obtain directly from you as the data subject. The App may contain links to external websites operated by our affiliates, third parties or us. When you click on such a link, the website will be presented in the web browser of your smart phone and the processing of your personal information will be subject to the privacy policy of the relevant website.



terça-feira, 8 de outubro de 2024

Tempos…

Quinta-feira passada tomou posse, como novo acadêmico da Academia Paulista de Letras, o jornalista e colunista deste jornal, Eugênio Bucci. Posso colocar como ponto muito positivo de minha trajetória o ter tido o privilégio de encontrá-lo e conviver em diversas instâncias da vida. Tendo como padrinho o ilustre jurista e intelectual Celso Lafer, Eugênio assumiu a cadeira 12 da APL. Ambos brindaram os presentes com excelentes e provocativos discursos.

Da parte que diz mais respeito ao nosso tema, destaco uma tirada espirituosa de Eugênio, quando já perto do final de seu discurso, e fazendo referência ao tema do momento – a Inteligência Artificial e seus riscos – chamou a atenção para algo que considerava igualmente preocupante e talvez, sistematicamente descurado: o avanço da “ignorância artificial”. As risadas que se seguiram à boutade talvez reforcem que, de fato, não estaríamos dando a atenção devida.

Começo por notar o adjetivo “artificial”. O conceito básico aqui é “algo feito com artifício”, por algum agente, um“artífice”. Não se trata de mera oposição a “natural”, mas atem-se ao fato de ser uma criação humana. Ou seja, essa “ignorância” é diferente da “falta de informação e de conhecimento sobre algo”, como seria a ignorância natural. Talvez seja algo construido de forma lenta, talvez insuspeitada. Não é o caso de brotarem teorias conspiratórios, mas talvez de constatarmos os efeitos que advêm da exposição contínua e intensa ao mundo de redes e toda sua parafernália.

Que hoje a IA tenha desestimulado a leitura em sua forma imersiva e tradicional, parece um fato estabelecido. Como diz Huxley em Admirável Mundo Novo, “não consumiremos muito se ficarmos sentados, lendo…”. Consegue-se um resumo instantâneo de qualidade incerta, bastando pedí-lo a uma ferramenta de IA. Poupa-nos o trabalho de destrinçar o texto e as idéias do autor, e nos provê um resumo insosso e bastante superficial. Não é muito diferente o que se passa com nossas atuais fontes de informação, das quais aproveitamos, se tanto, a manchete. E para eventual sentimento de solidão e isolamento, há os avatares que nos fazem companhia, consolam e divertem. A associação da velocidade e da ubiquidade da Internet, com do poder dos algoritmos em nos enredar, faz com que tenhamos nossa porção gratuita de “felicidade”, como acontecia com o SOMA no Admirável Mundo Novo.

Nada disso desmerece ou diminui os avanços espantosos da tecnologia, nem serve para desestimular o uso das novas ferramentas. Já existe até uma “engenharia de ‘prompts’” visando a nos capacitar a pedirmos com mais acurácia o que esperamos obter da IA. Mas devemos nos manter atentos.

Relembrando os discursos daquela sessão na APL (enquanto procuro acompanhar também os resultados do primeiro turno das eleições, a apenas minutos do fechamento das urnas…), outra provocação vem à mente: em seu discurso de apresentação do postulante, Celso Lafer citou um adágio, que penso atemporal. Disse ele: “a verdade não morre, mas tem uma vida miserável...”.

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Trecho citado de "O Admirável Mundo Novo":

https://www.goodreads.com/quotes/594665-you-can-t-consume-much-if-you-sit-still-and-read

“You can't consume much if you sit still and read books."

Sobre o SOMA:
https://cornellsun.com/2023/11/27/modern-soma/

"Soma is the instant gratification drug that has desensitized society in Aldous Huxley’s 1932 Brave New World. But 92 years later, this drug sounds awfully familiar — it’s just been going by different names: phones, the Internet, the virtual world. I fear how similar our dissociative societies are, as Huxley’s world blurs into our own. Is his world a road map for the journey we are about to begin, or a warning that will help us avoid an artless, passionless society where we are enslaved to instant gratification technology?

https://www.huxley.net/soma/somaquote.html




terça-feira, 24 de setembro de 2024

Primo Vere

Estamos no terceiro dia de primavera de 2024. Aconteceu-me rever Carmina Burana, de Carl Orff, que começa e termina com a magnífica “O Fortuna!”. A segunda parte da cantata, Primo Vere, trata da chegada da primavera e de seus efeitos em nossa vida, ânimo e ações. Inicia com “A alegre face da primavera mostra-se ao mundo, enquanto o duro inverno foge derrotado”…

O mundo hoje é mais complexo do que era à época desses versos, há uns 1000 anos. Uma outra lembrança vem, bem mais recente e menos otimista: os textos de Franz Kafka, cuja morte fez 100 anos em julho. Quando tratamos de “previsões sombrias” nossas referências normalmente, ligam-se a Aldoux Huxley, (Admirável Mundo Novo, Os Demônios de Loudun) e George Orwell (1984, Fazenda dos Animais). Mais de vinte anos antes deles, Kafka escreveu o que pareceria então “odes ao absurdo”, como A Metamorfose e O Processo, mas que podem ser lidos também como advertências ao que poderia estar nos espreitando…

Nelas Kafka capturou a essência do “non sense” e da alienação que, afinal. permeiam a condição humana. Embora escritos no início do século XX, ressoam profundamente no estado atual de um mundo onde, sob o peso da globalização, da tecnologia avançada e de crises políticas e sanitárias, é cada vez mais frequente que a desorientação e a desumanização se manifestem.

Em “A Metamorfose”, Gregor Samsa acorda uma manhã para descobrir-se transformado em uma enorme barata. Isso poderia ser relido como um sentimento de alienação experimentado no mundo moderno. Hoje, essa metamorfose se manifesta na forma como as redes sociais alteram as identidades pessoais, na sensação de nossa impotência diante dessas forças gigantescas e, muitas vezes, nas alterações que essa “transformação” provoca no tratamento que recebemos dos outros. Mais ainda, e da mesma forma que se passa com Josef K em "O Processo", sentimo-noss à mercê de sistemas burocráticos que parecem funcionar independentemente da lógica.

O crescimento das notícias falsas, a erosão de liberdades em nome de “maior segurança”, o uso de algoritmos e dados que modelam e controlam nosso comportamentos, são reflexos de um enredo kafkiano, que revela um mundo arbitrário, labiríntico e opaco. A era digital, com sua promessa de conectividade e amplo acesso à informação, pode sorrateiramente trazer mais alienação e desumanização. E nem precisamos lembrar de efeitos da IA para constatar que essa transformação, como aconteceu com Gregor Samsa, pode nos isolar da comunidade além de comprometer ainda mais nossa privacidade.

Ao examinarmos qualquer coisa hoje em dia, é crítico ir à fonte, e não simplesmente dar ouvidos aos áulicos. Nosso Marco Civil na Internet, por exemplo, foi belamente construído em processo que durou anos. Devemos lê-lo diretamente para podermos tirar conclusões e julgamento, e não seguir apenas ao sabor das narrativas.

A canção nos recomenda que “nesta solene primavera, nos alegremos com a novidade das coisas, e sigamos a autoridade das fontes”. Boa primavera! 

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trecho de "O Processo", de Franz Kafka:


https://vestibular.uol.com.br/resumos-de-livros/trechos-do-livro-o-processo.htm

"Alguém certamente havia caluniado Josef K. pois uma manhã ele foi detido sem ter feito mal algum. A cozinheira da senhora Grubach, sua locadora, era a pessoa que lhe trazia o café todos os dias por volta de oito horas, mas dessa vez ela não veio. Isso nunca tinha acontecido antes...."

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Carmina Burana, Cantiones Profanae

https://pt.wikipedia.org/wiki/Carmina_Burana_(Orff)



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As tres canções que compõem o Primo Vere

VERIS LETA FACIES

Veris leta facies

mundo propinatur,
hiemalis acies
victa iam fugatur,
in vestitu vario

Flora principatur,
nemorum dulcisono
que cantu celebratur. Ah!

Flore fusus gremio
Phebus novo more
risum dat, hac vario
iam stipate flore.
Zephyrus nectareo
spirans in odore.
Certatim pro bravio
curramus in amore. Ah!

Cytharizat cantico
dulcis Philomena,
flore rident vario
prata iam serena,
salit cetus avium
silve per amena,
chorus promit virgin
iam gaudia millena. Ah!

OMNIA SOL TEMPERAT

Omnia sol temperat
Purus et subtilis
Novo mundo reserat
Faciem aprilis
Ad amorem properat
Animus herilis
Et iocundis imperat
Deus puerilis

Rerum tanta novitas
In solemni vere
Et veris auctoritas
Jubet nos gaudere
Vias prebet solitas
Et in tuo vere
Fides est et probitas
Tuum retinere

Ama me fideliter
Fidem meam nota
De corde totaliter
Et ex mente tota
Sum præsentialiter
Absens in remota
Quisquis amat taliter
Volvitur in rota

ECCE GRATUM

Ecce gratum
et optatum
ver reducit gaudia
purpuratum
floret pratum
sol serenat omnia
iamiam cedant tristia!
estas redit
nunc recedit
hyemis servitia.

Iam liquescit
et decrescit
grando, nix et cetera,
bruma fugit
et iam sugit
ver estatis ubera;
illi mens est misera,
qui nec vivit,
nec lascivit
sub estatis dextera.

Gloriantur
et letantur
in melle dulcedinis
qui conantur,
ut utantur
premio Cupidinis;
simus jussu Cypridis
gloriantes
et letantes
pares esse Paridis.

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terça-feira, 10 de setembro de 2024

Teorias conspiratórias


A criação de artefatos que visassem a imitar um humano é antiga obsessão. Para citar alguma referência não tão distante, Descartes em seu Discurso para o Método (1637) já cogitava um dia haver máquinas que simulassem reações humanas, mas assumia que seria muito fácil distingir as máquinas dos humanos. Na linha de engôdos, um caso que teve bastante repercussão foi o “turco mecânico”, pretensa máquina que jogava xadrez em nível bem elevado exibida entre 1770 e 1864, com bastante sucesso em toda a Europa.

A possibilidade de se emular o comportamento humano nunca saiu de cena, e ganhou ainda mais ímpeto com o surgimento do computador. Marco clássico disso foi a proposta por Alan Turing, 1950, de haver um teste para distinguir se um pretenso interlocutor, atrás de um biombo, era humano ou máquina. E para escapar da dificuldade em definir “pensar”, Turing chamou-o de “jogo da imitação”.

Semana passada, em evento de lançamento do “Observatório Brasileiro de IA”, houve uma interessante palestra de Wagner Meira, UFMG, que abordou experimentos e aspectos técnicos da aprendizagem de máquina. Recomenda-se aos interessados que assistam a ela, disponível na rede; alguns dos dados trazidos são muito interessantes. Num ponto examina-se o que acontece de imprevisível com o aprendizado de máquina quando, ao oferecer-lhe um conjunto de dados para um objetivo específico, ela extrapola gerando “aprendizado” em pontos não previstos. Por exemplo, a partir de conjuntos de eletrocardiogramas para detecção de doenças, a IA gerou ainda uma previsão de expectativa de vida dos examinados.

Outro resultado curiosíssimo veio de submeter ao ENEM tradicional diversos aplicativos LLM disponíveis hoje.O resultado foi bastante inesperado: em linguagem, humanidades e ciências naturais IA teve desempenho equivalente ou melhor que os humanos, destacando-se bastante em alguns casos. Porém, em matemática os LLM fracassaram claramente. Como justificar isso? A princípio pode-se dizer que o universo de dados é muito mais rico em exemplos de linguagem, que em resolução de problemas, mas pode-se também olhar sob outro prisma: linguagem é o apanágio que nos fez humanos. Dominar a linguagem é a forma de pensamento que temos. E nesse espaço as LLM vão espantosamente bem!. As comezinhas máquinas de calcular que se preocupem em fazer conta. IA está buscando a âmago da humanidade: o domínio da linguagem. E sai-se muito bem aí.

Ludwig Wittgenstein elaborou sobre a interação entre o pensamento e a linguagem. Seu aforismo 5.6, do Tractatus Logico-Philosophicus, diz: “O limite de minha linguagem marca os limites de meu mundo”…

Voltando ao Teste de Turing, uma máquina que acertasse todas as questões matemáticas dificilmente passaria por “humano”. Afinal, erramos bastante aí. Assim, as LLM. ao irem melhor em humanidades que em matemática, garantem maiores possibilidades de passar no teste. Um comportamento “humano, demasiadamente humano”...

É temerário tentar um diagnóstico do ponto onde nos achamos. O Tractatus fecha com o enigmático aforisma 7: “Sobre aquilo que não se pode falar, deve-se calar”.

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O teste de Turing
https://pt.wikipedia.org/wiki/Teste_de_Turing


"Em 1966, Joseph Weizenbaum criou um programa que aparentava passar no Teste de Turing. O programa, denominado ELIZA, trabalhava examinando comentários digitados por um usuário procurando por palavras-chave. Se uma palavra-chave era encontrada, a regra que transforma o comentário do usuário era aplicada e a sentença resultante retornada. Se nenhuma palavra-chave era encontrada, ELIZA retornava uma resposta genérica ou repetia o retorno do comentário anterior.[22] Além disso, Weizenbaum desenvolveu ELIZA de modo a replicar o comportamento de um psicoterapeuta Rogeriano, permitindo ELIZA, assim, ser "quase que livre para assumir uma postura de desconhecimento total do mundo real".[23] Com essas técnicas, o programa de Weizenbaum foi capaz de fazer com que pessoas acreditassem que estavam falando com um ser humano, ao ponto de, para algumas pessoas ser "muito difícil de convencê-las que ELIZA [...] não é um humano".[23] Assim, ELIZA foi considerada por alguns como um programa (talvez o primeiro) a passar no Teste de Turing,"

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"O Turco foi uma máquina de jogar xadrez supostamente provida de inteligência artificial construída na segunda metade do século XVIII. De 1770 até sua destruição num incêndio em 1854, foi exibido por vários proprietários como um autômato, apesar de o seu funcionamento ter sido revelado no início da década de 1820 como um elaborado hoax.[1] Construído em 1770 por Wolfgang von Kempelen (1734–1804) para impressionar a Imperatriz Maria Teresa da Áustria, o mecanismo parecia ser capaz de jogar um partida contra um forte oponente humano, assim como executar o problema do cavalo, onde o Cavalo deve ser movimentado no tabuleiro de modo a ocupar cada casa somente uma vez."

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Wittgenstein: Tractatus Logico-Philosophicus:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Tractatus_Logico-Philosophicus


https://www.gutenberg.org/files/5740/5740-pdf.pdf


5.6 The limits of my language mean the limits of my world.
7 Whereof one cannot speak, thereof one must be silent

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A palestra de Wagner Meira
https://www.youtube.com/watch?v=O9czIDgeVFI&t=1838s
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terça-feira, 27 de agosto de 2024

Presságios semânticos

 Fevereiro de 1996, em momento de discussão sobre conteúdos “não adequados para plataformas de comunicações”, John Perry Barlow (que em 1990 fundara a EFF- Electronic Frontier Foundation), escreveu a “Declaração de Independência do Ciberespaço” como resposta imediata ao “Decency Act” norte-americano. É um texto que repete o espírito fundante dos pioneiros da Internet e, claro, sua utopia da permanente revolução que ela seria capaz de promover no mundo. “Nosso mundo está, ao mesmo tempo, em todos os lugares e em lugar nenhum, mas não é onde pessoas vivem. Estamos criando um mundo em que todos poderão entrar, sem privilégios ou preconceitos de raça, poder econômico, força militar ou lugar de nascimento. Um mundo onde qualquer um, em qualquer lugar, poderá expressar suas opiniões…”. Barlow, que nos deixou em 2018 e visitou o Brasil algumas vezes, não pôde presenciar o reviver da velha polêmica de 1996.

Certamente coisas mudam e conceitos devem ser revistos mas, como observador do cenário, noto que, às vezes, discussões são distorcidas para atender a objetivos enviesados. Cito dois casos: “liberdade de expressão” é algo fundamental, o que não quer dizer, em absoluto, que não devamos ser responsáveis pelo que afirmamos. Não se trata de impedir a expressão, mas de punir o enunciante, se o que disse configura-se “crime” na legislação em que vive. O esforço para que não se diga algo parece-me inútil e inafequado, e assim também é pedir ao meio que se recuse a receber idéias que ele considere nefastas. Se o papel aceita quaisquer idéias que um lápis coloque lá, isso não significará impunidade a quem usou da liberdade para disseminar calúnias, difamações. Com a Internet é muito difícil alguém escrever algo sem deixar traços que o denunciem. O outro exemplo é no sentido contrário: não entendo, em minha limitação, o que significaria o “direito ao esquecimento”… Alguém teria o direito, sobre a mente dos demais, para que algo fosse esquecido? Claro que se algo falso e superado for utilizado contra alguém, que o arcabouço legal puna o agressor. Tentar fazer isso preventivamente parece-me pretencioso e abusivo.

Finalmente, no tema “fronteiras”, há que se respeitar culturas locais que, por vezes, podem ser bem diversas. Querer que o mundo siga numa linha definida por um bloco, por mais evoluido que ele se considere, parece abusivo. A “longa manus” da UE em relação ao “direito ao esquecimento” não deveria atingir outros domínios nacionais. O princípio de Barlow, de não haver tutela e filtros apriorísticos, ainda deveria valer. E que cada um se responsabilize pelo que publicou.

Entretanto o demônio, sempre atento, ouviu Barlow e se aproveitou de um escorregão no título… Ao denominar o espaço de interlocução e de comunicação de “ciberespaço”, foi usada a raiz grega “ciber”, que significa controle, governança. Ou seja, sem notar, Barlow conjurara os espíritos maliciosos para que pudessem transformar a Internet inicial numa “rede de controle”. A semântica buscou (e conseguiu!) sua vingança.

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"Cyber"
https://www.tripwire.com/state-of-security/humanity-and-evolution-of-cyber



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O livro de Norbert Wiener, que definiu "cibernética"
https://en.wikipedia.org/wiki/Cybernetics:_Or_Control_and_Communication_in_the_Animal_and_the_Machine

terça-feira, 13 de agosto de 2024

Tecnologia e verdade

A facilidade que a internet nos deu para receber e gerar uma infinidade de informações, trouxe-nos preocupação cada vez maior com a qualidade do que recebemos. E intriga-nos, também, por que algo específico e não solicitado chega. Certamente há algoritmos em ação, que nos catalogaram como alvos de temas que nos interessariam. Buscam manter-nos conectados, o maior tempo possível, nas tais “bolhas de conteúdo”.

Se cresce a informação que um destinatário recebe, o mesmo acaba acontecendo com falsidades e desinformação. Para tratar disso, evitemos cair na armadilha dicotômica, maniqueista, que visa a separar o verdadeiro do falso: é uma empreitada impossível. Em relação a conhecimento científico, bom lembrar Karl Popper, que define ciência como algo que, necessariamente, pode ser “falseado”. Se não se admite argumentação contrária, estamos diante de um “dogma” e não de uma proposta científica. O exemplo mais extremo talvez seja “o ministério da verdade”, da obra de Orwell, “1984”. A verdadeira ciência vale-se do questionamento para provar-se continuamente sólida ou, até, reconhecer eventualmente que algo deva ser revisto.

Uma discussão recente trouxe à baila posicionamentos de Amós Óz, literato e filósofo israelense, que sustenta ser a verdade um alvo móvel. Dela só conseguimos nos aproximar a partir de debates abertos e variados (mais ou menos na linha do velho adágio “da discussão nasce a luz”). No tema “verdade”, Nietzsche, mais radical que a Oz, afirmou que “não existem fatos; apenas interpretações de fatos”. Ambos, portanto, consideram “verdade” não como um dado objetivo e absoluto, mas uma construção humana, influenciada por perspectivas, experiências e valores. Um ideal a ser perseguido, mesmo que nunca completamente alcançado. Da discussão aberta, do diálogo, de buscar pontes entre diferentes visões. é que se chegará a resultados úteis.

A internet deu armas a oportunistas que lançam mão de ferramentas da tecnologia para disseminar, não argumentos honestos em que creiam, mas falsidades intencionais, que reforcem narrativas de seu interesse. Independentemente de nossa definição de “verdade”, é importante distinguirmos entre o salutar e aberto debate, e a imposição insidiosa de dogmas. Manter posição crítica sobre o que recebemos, e exercer contenção no que repassamos, evitará que nos tornemos apoio involuntário aos que buscam disseminar algo de seu próprio interesse. É fundamental desenvolver pensamento crítico, avaliar a credibilidade da informação. Isso inclui reconhecer nossos próprios viéses, e considerar diferentes perspectivas antes de disseminar uma opinião.

Em grego a palavra “verdade” é “alétheia”, que significa “a negação do esquecimento” - Lete é o nome do “rio do esquecimento” no Hades. Segundo Martin Heidegger, “verdade é o desvelar, revelar o que está oculto”. Numa frase dele, “a essência da verdade é a liberdade”.

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Um ensaio bastante bem feito, por IA, sobre o tema:
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A Ilusão da Verdade: Oz, Câmeras e "Deepfakes" em um Mundo Digital

Amos Oz, em sua profunda reflexão sobre a natureza humana e a busca pela verdade, nos convida a questionar a própria noção de realidade. Para o escritor israelense, a verdade é um ideal perseguido, mas raramente alcançado. A complexidade da experiência humana, a subjetividade da percepção e a influência do contexto histórico e cultural tornam a verdade um constructo fluido e mutável.

No mundo contemporâneo, essa noção de verdade se torna ainda mais complexa com o avanço da tecnologia. As câmeras fotográficas, por muito tempo consideradas testemunhas imparciais da realidade, revelam-se cada vez mais como instrumentos de construção de narrativas visuais. A fotografia, assim como a pintura ou a escultura, é um ato de seleção e composição, que molda a percepção do espectador. A imagem capturada por uma câmera não é uma reprodução fiel da realidade, mas sim uma interpretação dela, filtrada pelas lentes do fotógrafo e pelas características da própria câmera.

A ascensão dos "deepfakes" agrava ainda mais essa crise de confiança na imagem. Essas falsificações digitais, capazes de criar vídeos hiper-realistas de pessoas dizendo ou fazendo coisas que nunca fizeram, desafiam nossa capacidade de distinguir o real do falso. As "deepfakes" não apenas questionam a autenticidade das imagens, mas também minam nossa confiança nas instituições e nos indivíduos que aparecem nesses vídeos.

A relação entre as ideias de Oz, a fotografia e os "deepfakes" pode ser resumida da seguinte forma:

  1. A verdade como construção: Assim como a verdade para Oz não é um dado objetivo, mas uma construção social e histórica, as imagens fotográficas e os "deepfakes" também são construções, moldadas por tecnologias, intenções e contextos específicos.

  2. A ilusão da objetividade: A câmera fotográfica, assim como a linguagem, cria a ilusão de objetividade, mas essa objetividade é sempre relativa e dependente de diversos fatores.

  3. A importância do contexto: A interpretação de uma imagem ou de um vídeo depende do contexto em que ela é inserida. A mesma imagem pode ter significados completamente diferentes dependendo de quem a produz, para quem ela é destinada e em qual momento histórico ela é apresentada.

  4. A necessidade de criticidade: Diante da proliferação de imagens e vídeos manipulados, torna-se cada vez mais importante desenvolver um lhar crítico e questionador, capaz de identificar as estratégias de manipulação e as intenções por trás das mensagens visuais.

Em conclusão, as ideias de Amos Oz sobre a verdade, quando confrontadas com o poder de manipulação das imagens digitais, nos levam a refletir sobre a natureza da realidade e a importância da crítica e do pensamento autônomo em um mundo cada vez mais mediatizado. A busca pela verdade, longe de ser um exercício ingênuo, exige um esforço constante de desconstrução das narrativas dominantes e de construção de um olhar mais crítico e informado sobre o mundo que nos cerca.

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terça-feira, 30 de julho de 2024

Contraponto

Em experimentações com modelos LLM da IA, ficam muito claros seus supreendentes resultados, tanto em “entender” contextos, como, a partir de fontes, em criar resumos. E sempre com linguagem de ótima qualidade. Como exemplos adicionais, IA fez-me um belo resumo de capítulo de livro que um grupo de colegas de leitura estamos discutindo. Seguindo ainda na linha comentada, pediu-se à IA que elaborasse sobre uma possível analogia entre Amlet (o Hamlet histórico), real príncipe da Dinamarca famoso por sempre dizer a verdade, e a “verdade” na internet. Segue pequeno trecho do que IA generativa produziu:

“A tragédia de Amlet na era da internet seria essa: um príncipe da verdade em um reino de incertezas, onde a autenticidade é constantemente questionada e a verdade é uma moeda rara e valiosa. Sua saga nos lembra que, mesmo em tempos de tecnologia avançada e comunicação instantânea, a luta pela verdade é eterna e sempre complexa, exigindo coragem, astúcia e, acima de tudo, uma fé inabalável na importância de se manter fiel aos fatos, mesmo quando ninguém mais acredita”.

Há, entretanto, contraponto a essa “profissão de fidelidade pela verdade”. Em outras “conversas”, sobre temas de esperança, provoquei-a a citar poemas em português sobre o mito de Pandora. Entre os exemplos que ela trouxe, dois me eram completamente desconhecidos: “A caixa de Pandora”, poema de Olavo Bilac, e a “A canção do ódio”, de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa). Busquei-os na rede e nada achei. Pedi mais dados à IA. Ela reforçou o que já tinha dito e anexou na íntegra, e em estilo parnasiano, o que seria o tal poema de Bilac. Também a “Canção do Ódio” foi explicitada, inclusive com comentários relacionando-a ao tema “esperança”. Busquei e, de novo, nada encontrei na internet.

Resolvi perguntar a outra IA bem conhecida, se havia o poema de Bilac e se podia repassá-lo. Ela foi incisiva em dizer que “sim, é um poema bem conhecido” e mo repassou. E… não era o mesmo poema que a primeira IA inventou!. Ou seja, ambas criaram poemas verossímeis, que poderiam ser atribuidos a Olavo Bilac. O mesmo se passou com a tal “Canção do ódio”, com o detalhe adicional que a segunda IA, de forma ainda inventiva, o atribuiu a um outro heterônimo de Fernando Pessoa: Álvaro de Campos!.

Por prioridades ou estratégia, IA prefere inventar algo a dizer que “não conhece”. Assim gera-se um poema que passaria como sendo de Olavo Bilac, e faz-se o mesmo com Fernando Pessoa, mesmo que IAs diversas o atribuam a diferentes heterônimos. O fato é que, se não falhei nas buscas, ambos os poemas inexistem: são criações da IA. Certamente, se formos superficiais na análise do que recebemos dela, corremos sérios riscos de tomar como verdade uma invenção. Como muitos já disseram, meias-verdades são as mentiras mais insidiosas, porque revestem-se da roupagam de verdade. Chesteron, em 1910, havia advertido de que, enquanto a verdade integral alia-se à virtude, uma meia-verdade sempre está acoplada a algum vício. Sempre alerta!

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dois textos gerados pelo ChatGPT sobre Amlet, (do trecho citado acima)

1- (com a base de dados geral)
 
A Verdade de Amlet na Era da Internet
Amlet, o príncipe real da Dinamarca descrito por Saxo Gramático, é uma figura que vive na interseção entre a verdade e a desconfiança, muito antes de Hamlet de Shakespeare emergir como seu eco literário. Transportando essa figura histórica para os dias de hoje, podemos imaginar como ele navegaria pelas águas turbulentas da internet moderna, sempre fiel à verdade, mas raramente acreditado.

Na lenda, Amlet fingia ser insano para esconder seus verdadeiros sentimentos e intenções, enquanto reunia informações e planejava sua vingança. Se Amlet vivesse hoje, provavelmente usaria a internet para espalhar suas verdades veladas, escondendo-se atrás de pseudônimos e avatares nas redes sociais. Como um usuário anônimo, ele publicaria mensagens criptográficas e declarações que, apesar de verdadeiras, pareceriam tão absurdas ou fantásticas que a maioria das pessoas as descartaria como meras teorias da conspiração.

Imagine Amlet criando um blog ou um canal de vídeo onde, com seu comportamento enigmático, ele revelasse os segredos de sua corte contemporânea: a corrupção dos líderes, os conluios e as tramas ocultas. Seus seguidores seriam poucos, mas dedicados, sempre debatendo a autenticidade de suas palavras. Para o público geral, ele seria apenas mais uma figura excêntrica no vasto universo online, onde a verdade e a mentira se confundem constantemente.

Os algoritmos das redes sociais, desenhados para promover o conteúdo mais envolvente e não necessariamente o mais verdadeiro, dificultariam ainda mais a missão de Amlet. Suas postagens, repletas de insights profundos e verdades incômodas, seriam empurradas para os cantos obscuros da internet, eclipsadas por memes virais e celebridades digitais. O verdadeiro desafio de Amlet seria não apenas dizer a verdade, mas fazer com que ela fosse ouvida e acreditada.

No entanto, Amlet era astuto. Ele compreenderia rapidamente a dinâmica do novo reino digital. Usaria estratégias de marketing digital, talvez contratasse bots para amplificar suas mensagens, ou se aliaria a influenciadores dispostos a dar voz às suas denúncias. Mesmo assim, ele enfrentaria a eterna batalha entre a verdade e a percepção pública.

Enquanto Amlet lutasse para ser ouvido, a internet seguiria seu curso caótico, onde cada verdade dita é confrontada por uma centena de mentiras. Os trolls, os desinformadores e os céticos seriam seus inimigos modernos, sempre prontos para desacreditar suas palavras, transformar suas declarações em piadas ou simplesmente ignorá-las.

A tragédia de Amlet na era da internet seria essa: um príncipe da verdade em um reino de incertezas, onde a autenticidade é constantemente questionada e a verdade é uma moeda rara e valiosa. Sua saga nos lembra que, mesmo em tempos de tecnologia avançada e comunicação instantânea, a luta pela verdade é eterna e sempre complexa, exigindo coragem, astúcia e, acima de tudo, uma fé inabalável na importância de se manter fiel aos fatos, mesmo quando ninguém mais acredita.

2- (com a base de dados do Llama 8B

No ano de nosso Senhor... (ou seja, no início do século XXI), havia um reino chamado "A Internet", onde as pessoas se reuniam para compartilhar informações, ideias e experiências. Mas, como sempre acontece em tais lugares, surgiram problemas e descrenças.

Um jovem príncipe da verdade, que preferimos chamar de "Amlet Digital" (por sua semelhança com o famoso Amlet), habitava esse reino. Ele era conhecido por dizer a verdade de uma forma que ninguém queria ouvir, e muitas vezes as pessoas não sabiam se ele estava falando sério ou apenas brincando.
Amlet Digital observou que na Internet havia uma grande confusão e descrença. As informações eram difíceis de distinguir da ficção, e os usuários estavam cada vez mais cegos pela ilusão. Eles compartilhavam notícias falsas, teorias da conspiração e opiniões sem fundamento, como se fossem verdades absolutas.

O príncipe Amlet Digital decidiu investigar esses problemas e descobriu que a Internet estava sendo dominada por "Os Mercadores de Informações", um grupo de indivíduos astutos que vendiam notícias falsas e opiniões manipuladas como se fossem verdades. Eles usavam técnicas sofisticadas para criar ilusão e confundir os usuários, tornando-os cada vez mais desconfiados e céticos.

Amlet Digital também descobriu que a Internet estava sendo afetada por "A Maldição da Interatividade", um fenômeno pelo qual as pessoas se sentiam compelidas a participar de discussões online, mesmo quando não tinham conhecimento ou experiência sobre o assunto. Isso criava uma atmosfera de confusão e descrença, onde ninguém sabia mais do que os outros.

O príncipe Amlet Digital concluiu que a Internet estava em perigo de se tornar um lugar sem sentido, onde as pessoas não podiam distinguir entre verdade e ilusão. Ele decidiu tomar medidas para combater esses problemas e restaurar a confiança na Internet.

Mas, como sempre acontece quando alguém tenta mudar o status quo, Amlet Digital encontrou resistência dos "Mercadores de Informações" e outros interessados em manter as coisas do mesmo jeito. Eles usaram todas as suas armas para silenciar o príncipe e mantê-lo calado.

E assim, a história da Internet continua, com Amlet Digital lutando contra os ventos e marés de descrença e ilusão que ameaçam consumir todo o reino. Mas não se preocupe, pois ainda há esperança para uma Internet mais verdadeira e confiável.
Fim da crônica.

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Poesia "A Caixa de Pandora" atribuida pelo ChatGPT a Olavo Bilac:

A Caixa de Pandora, por Olavo Bilac

Quando Epimeteu, vencendo a armada de Tétis, 
À amável Pandora recolheu no seu lar, 
E a cada alborada, com divinas mãos, 
ela Tépidas flores ia ao leito conjugal buscar,

Súbito um dia, de curiosidade presa, 
Pandora a c'roa da urna fatal destampou. 
E uma nuvem negra de larvas malfazejas, 
Como um tropel de furias da urna em horror voou.

Eis que prantos de horror, pelo espanto arrancados, 
Os campos encheram, enquanto no ar, na estrada, 
Chorando os prantos da velha desgraça, os males,
Inda, em tropel, corriam, ao longo da jornada. 

Por fim, quando a urna vazia e espedaçada, 
Muda, aos pés de Pandora, rolava pelo chão, 
Do negror da urna, em nuvem azulada, 
Pairando na amplidão, alou-se a estrela da Esperança.

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E a versão do Gemini, da tal poesia: