segunda-feira, 8 de setembro de 2014

A encruzilhada da Internet

Em Istambul houve, na semana que passou, o nono Internet Governance Forum (IGF). Um evento grandioso com mais de 3 mil inscritos de todo mundo e com uma agenda com cerca de 200 sessões de vários tópicos.

A primeira reunião do IGF foi em 2006, em Atenas, com 300 participantes e, no ano seguinte, o IGF foi realizado no Rio de Janeiro, quando já havia mais de 500 participantes. Entre os temas tratados nessa edição, estão neutralidade da rede, interesse público, proteção à criança, legislação e o risco de fragmentação da rede. Tratar de algo que desconhece fronteiras sempre traz desafios e tensão aos mecanismos de aplicação das leis nacionais e de soberania.

Outro tema quente diz respeito à transição da Internet Assigned Numbers Authority (Iana). Nos anos 80/90, esse grupo era composto por pesquisadores liderados por Jon Postel na University of Southern Califórnia (USC), que cuidavam de três tópicos críticos para Internet nascente: a atribuição de números IP às redes ingressantes, a manutenção da base de informações sobre protocolos-padrão e parâmetros técnicos referentes ao funcionamento da rede, e a manutenção e atualização do conteúdo da raiz de nomes da Internet.

É nesta raiz que toda a estrutura de nomes está "ancorada" e nela constam os domínios de nível mais alto (TLD), sejam eles de país, como o ".br", sejam genéricos, como ".net" e, agora, ".rio", além de outros. Com o crescimento da rede, o Departamento do Comércio (DoC) dos EUA entrou em cena em 1998 e chamou organizações sem fins de lucro para que se candidatassem a assumir o papel e as funções da Iana.

A Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (Icann), uma ONG instalada em Los Angeles, ganhou o contrato no final de setembro de 1998, um ano bastante tenso e tumultuado para a Internet. Cerca de um mês depois de a Icann assumir a Iana, Jon Postel faleceu. Sem ele, um clima de incerteza pode ter motivado um novo contrato, firmado entre a National Telecommunications and Information Administration (Ntia, vinculada ao DoC) e a Icann; que passaria a "supervisionar" a manutenção da raiz.

Qualquer alteração proposta e aceita pela Icann e pela Iana só poderia entrar em vigor após passar pelo crivo da Ntia. O contrato dava a um único instituto de governo o privilégio de autorizar ou não a alteração na raiz. E, pior, o que parecia ser provisório foi se eternizando. Em março de 2014, pouco antes da NETmundial, importante reunião realizada em São Paulo, a Ntia surpreendeu ao anunciar que pretendia não mais renovar o contrato trianual com a Iana, quando de seu término em 2015. Uma boa notícia! Resta ver quais propostas surgirão para assumir (ou, até mesmo, eliminar) o papel de "avalizador" das alterações na raiz de nomes da Internet.

Discute-se assim, em Istambul, a encruzilhada atual da Internet. Que esses temas sejam tratados em Istambul, um caldeirão de culturas e tradições, não deixa de ser intrigante. É, certamente, muito adequado cuidar aqui de Política, na mais profunda acepção etimológica do termo. Tratemos de política "na Pólis", em grego "éis stin Póli", expressão cujo som gerou "Istambul".

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Vai no 'quilo' ou no 'bufê', chefe?

Uma das rupturas da Internet em relação à gestão tradicional das telecomunicações está na maneira de tratar a cobrança dos serviços. Na Internet a forma de cobrar nunca foi preocupação. Já nas telecomunicações geridas pela União Internacional de Telecomunicações (ITU), gerar a "conta" para o usuário é tema central.

A telefonia tradicional usa uma tecnologia conhecida como "comutação de circuitos". Um caminho é reservado entre origem e destino durante toda a conexão telefônica, mesmo que o usuário fique em silêncio. E a cobrança leva em conta a duração e a distância da chamada. É bem mais caro ligar para alguém na Ásia que para um vizinho de bairro. Na Internet a tecnologia é outra: a "comutação de pacotes", usada no TCP/IP. Os "pacotes de dados" originários de uma "conversa" disputam com outros "pacotes" os caminhos possíveis na rede, gerando uso mais eficiente dos recursos. Nem o tempo de conexão, nem a distância fazem parte do ambiente internet.

É verdade que no início, quando a infraestrutura era precária e o acesso à Internet era ainda sobre telefonia, a forma usual de cobrança podia envolver o tempo de conexão. Mas à medida que os cabos ópticos e a banda larga se disseminaram, aumentou tremendamente a capacidade de transmissão e a Internet pôde voltar ao modelo de cobrança baseado em aluguel de "banda", de capacidade, tornando-se esse o padrão para a conexão doméstica.

Cobrar por capacidade pode parecer estranho se comparado à telefonia, mas há muitos casos rotineiros em que se paga algo fixo, definido estatisticamente. Aluguel de automóvel sem limite de quilometragem, passaporte para parque de diversões e restaurantes fornecem exemplos. Pode-se ir a um restaurante e pagar fixo ("bufê") com consumo livre, ou escolher pagar pelo "peso" da refeição. Ambos os modelos se sustentam perfeitamente.

Voltando ao acesso doméstico à rede, o usuário pode escolher quanta "banda" quer contratar (qual a "bitola do cano" que o conectará à rede) e o provedor usará uma tabela calculada estatisticamente para definir o valor a cobrar. É sobre essa banda IP que rodarão serviços de texto, som, vídeo ou, até, telefonia. É o modelo Internet em ação. Por outro lado, se o assinante de um serviço móvel faz uso de 3G ou 4G, ele estará usando como base de acesso a telefonia tradicional. Sobre ela poderá receber Internet e seus serviços, mas neste caso a estrutura subjacente tem sua raiz no modelo telefônico.

Ou seja, a forma de cobrança pode se basear, agora, na utilização da infraestrutura, no consumo, e não na capacidade de banda. Diga-se, por sinal, que a estatística aqui é bem mais complexa porque pode haver concentrações típicas em eventos, congestionando a célula local que atende os assinantes em cada instante.

Usar a rede sem preocupações com tempo de conexão e com tráfego de dados gera uma postura mais reflexiva, mais contributiva e traz mais riqueza à Internet. À época do acesso discado, depois da meia-noite o gasto era um único pulso telefônico e muitos esperavam a madrugada para ir à rede. Esta restrição ficou no passado. Que outras, evitáveis, não surjam hoje.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Não se mata o mensageiro!

Dois dos três pilares básicos do Marco Civil foram analisados, superficialmente, nesta coluna: neutralidade e privacidade. Resta tratar do terceiro, a correta responsabilização das más ações na rede. A internet sempre se pautou por usar do bom senso quando da definição de suas funcionalidades. Sempre que possível, os modelos tradicionais, simples e fáceis de justificar, são os preferidos nas implementações. O protocolo que define "e-mail", por exemplo, chama-se SMTP (Simple Mail Transfer Protocol) e, não por acaso, imita o correio tradicional em muitos pontos. Um deles é não pedir autenticação ao remetente. Da mesma forma que o correio trabalha, basta usar um envelope devidamente formatado e endereçado para que seu conteúdo seja entregue ao destinatário.

Por outro lado, a internet é uma rede baseada em protocolos e que pode, em tese, controlar tudo o que nela se passa. Se a isso adicionarmos a crescente aspiração por segurança, está montado um caldo que pode gerar uma rede não apenas monitorada, mas com censura embutida, empobrecimento nos conteúdos e sem garantia de um florescimento livre.

Quando alguém considera-se atingido por conteúdo ofensivo, mentiroso ou calunioso, certamente pode e deve procurar alívio. Mas não é o portador do mau conteúdo o responsável, ou mesmo corresponsável. Permitir que o intermediário possa ser automaticamente considerado como corresponsável, quando ele se recusa a cumprir um pedido de usuário para remoção de conteúdo, pode ser uma forma de chantagem que abrirá as portas para uma autocensura. Ninguém, especialmente um pequeno empreendedor, quer ser responsabilizado por coisas que seus frequentadores dizem ou fazem. Se essa regra não ficar bem definida, empreender implicará em correr riscos jurídicos grandes e, pior, desconhecidos.

O Marco Civil estipula que o responsável pelo conteúdo é quem o gerou e publicou, não a "parede" em que ele foi escrito, o envelope em que ele foi remetido ou a rede social em que surgiu. Além disso, não compete ao intermediário avaliar e diferenciar o que seria calúnia do que é mera polemica ou denúncia. Para isso há o Judiciário, que examinará o material e decidirá se o solicitante tem razão em pedir sua exclusão, ou é algo lícito, que pode permanecer. É claro que, havendo ordem judicial de remoção, o intermediário passa a ser responsável pelo seu cumprimento nos prazos estipulados.

Em decisão do STJ, anterior ao Marco Civil, lê-se: "O dano moral decorrente de mensagens com conteúdo ofensivo inseridas no site pelo usuário não constitui risco inerente à atividade dos provedores de conteúdo, de modo que não se lhes aplica a responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do CC/02". É exatamente esse princípio que o Marco Civil defendeu.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Privacidade, isso ainda existe?

...  e o que vocês sussurraram aos ouvidos, dentro de casa, será proclamado dos telhados”
Lucas 12:3

Houve um tempo em que a Internet era considerada o livre mundo da anonimia, da invisibilidade na ação, do não monitoramento, Lá se podia interagir sob o manto de um pseudônimo e a nossa navegação nunca seria rastreada. Mas essa concepção da rede é fundamental e tecnicamente errada. Sem falar nas recentes revelações de Edward Snowden, os desenvolvimentos e serviços que surgem comprometem ainda mais a possibilidade da ação anônima na Internet.

O primeiro aspecto a considerar é que a tudo na Internet depende de protocolos. Se visitamos um sítio, nossa intenção de lá entrar é conhecida pelo servidor, que nos dará (ou não...) permissão de acesso. E, claro, todos somos identificados pelo nosso número IP, tanto visitantes como visitados. Assim, ao contrário de serviços no mundo tradicional, onde podemos ouvir rádio ou assistir à TV sem que as emissoras apercebam-se disso, um acesso a um emissor de rádio na Internet depende de autorização para que nosso IP possa receber o fluxo de dados correspondente e, certamente, esse fato pode ser arquivada para o futuro. Ou seja, uma emissora na Internet sabe exatamente que IPs recebem seus dados a cada instante.

Mais que isso, e até para algum conforto adicional, muitas vezes somos “carimbados” pelos sítios que visitamos para sermos reconhecidos em uma eventual volta. Como o que se passa quando alguém sai de uma festa mas a ela pretende voltar em seguida. Esses “carimbos”, os “cookies”, nos facilitam a vida porque não precisamos nos reidentificar a cada passo mas, por outro lado, deixam em nosso sistema marcas que podem durar por bastante tempo. O navegador que usamos exibe os “carimbos” quando voltamos ao sítio, para sermos reconhecidos como usuários e para que uma interação, eventualmente interrompida, possa continuar de onde parou. Podemos instruir o navegador para que não aceite “cookies”, mas isso pode ser um estorvo grande para a nossa interação.

Outras ameças existem: o uso da rede para armazenamento de dados pessoais pode expô-los aos que gerem os serviços. Pode acontecer com o nosso correio eletrônico, com listas de endereços, com redes sociais. A capacidade assombrosa de processamento que há hoje permite que se possa ir além: pedaços de informação como palavras que buscamos, números IP usados, horários e sítios que visitamos, podem ser agrupados e acumulados, identificando-nos virtualmente. Mesmo que nossa identidade não esteja claramente lá, a individualização da informação levará fatalmente a que sejamos localizáveis pela tecnologia conhecida como “big data”. E com a adição, em breve, de nossos equipamentos caseiros à “internet das coisas”, ainda mais dados, preferências e características pessoais serão automaticamente coletáveis.


O Marco Civil trata da preservação da privacidade possível, ao restringir a coleta de informações àquelas que são diretamente ligadas à transação em curso. É claro que quando usamos um banco pela rede, tanto o banco como nós mesmos devemos ter certeza de quem é o interlocuotor. Idem se compramos algo pela rede, a ser entregue em um endereço físico. Nossa privacidade depende do contexto: ela é diferente numa roda de amigos, numa livraria ou num banco. Mas, certamente, não é assunto da livraria ou do banco saber quais são nossos amigos, da mesma forma que não compete a quem nos transporta ao banco ou à livraria saber o que fomos fazer por lá. O Marco Civil estabelece que as infomações coletadas devem ser as que dizem respeito ao dado contexto, que devemos ter sempre o direito de saber quais informações serão coletadas e que podemos, em caso de não concordar em usar o serviço, de pedir que nossos dados sejam descartados.

domingo, 13 de julho de 2014

A Internet nasceu neutra e deve permanecer assim

O “Diccionario da Língua Portugueza”, de Antonio de Moraes Silva, de 1789, define neutralidade como a “indifferença do que não toma bando, nem favorece nenhum dos partidos”.

Há três semanas entrou em vigor o Marco Civil da Internet. A lei colocou o Brasil na vanguarda dos países que protegem a rede e seus usuários.

A discussão que precede a aprovação do Marco Civil estendeu-se por anos e teve um de seus focos principais no tema da neutralidade. A lei aprovada defende a neutralidade da rede, mesmo entendendo que pode haver casos de exceção a ela, a serem individualmente tratados em eventual regulamentação adicional posterior.

Alio-me aos que defendem intransigentemente a neutralidade da rede, até porque é algo que deve ser buscado em todos os ramos de atividade e em todas as transações. A rede nasceu neutra, permitindo comunicação direta entre origem e destino da informação, sem admitir que alguém no meio do ambiente filtre ou bloqueie os dados que trafegam.

Não era conceito novo: tanto nos correios como na telefonia pressupunha-se que ninguém interferisse ilegalmente no conteúdo que lá trafega. Mas a neutralidade da Internet alcança outros níveis, especialmente devido à constante possibilidade de inovação.

Ninguém imaginava em 1990, por exemplo, que a web surgiria e menos ainda avaliaria seu impacto. Ou que as redes sociais teriam o alcance e o poder que lograram em poucos anos. É fundamental, assim, que a Internet seja preservada como um “jardim sem muros”, onde novas aplicações surjam de um dia a outro e estejam ao alcance de todos.

Ao contrário do que se passa, por exemplo, na distribuição de TV por assinatura, onde canais novos têm que ser subscritos pelo assinante, na Internet todos, independentemente da quantidade de banda que assinam, podem ter acesso às “novidades”. Assim qualquer novo serviço sobre a rede será passível da experimentação e sujeito ao crivo dos usuários. Sobreviverá ou não devido a seus méritos e características, como tem sido a regra na rede.

Tratar por igual os serviços não impede que os haja gratuitos ou pagos, bons ou ruins, leves ou demandantes de recursos, mas atribui ao usuário o poder de escolha ao acessar o que quiser, e pagar pela quantidade de banda que pretende ter. Isso é bom para o mercado, bom para o usuário e bom para o empreendedor.

E exceções? Apenas para citar uma, há práticas mal intencionadas na rede, que visam minar a própria neutralidade dela e que, portanto, devem ser tratadas como exceção, para a própria preservação da neutralidade ampla. Parece uma contradição, mas isso ocorre quando se detecta um ataque do tipo “negação de serviço”, quando alguém quer impedir que um site ou um serviço seja acessível aos demais usuários, usando para isso de meios automáticos que geram uma sobrecarga artificial.

A forma de amenizar esse tipo de ataque passa por filtrar endereços da origem do ataque. Ou seja, pode haver necessidade específica de interferir no processo “fim-a-fim” da Internet, exatamente para preservá-lo neutro.

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Vinho com gosto de vinagre

Com mais de 3 mil participantes, a 50ª reunião da Corporação da Internet para Designação de Nomes e Números (Icann) em Londres, semana passada, foi a maior até hoje. E entre os temas mais discutidos, o vinho!

Não a bebida em si, mas ela na forma de dois domínios genéricos, o “.wine” e o “.vin”, cuja eventual concessão aos solicitantes foi considerada inaceitável por diversos países europeus, liderados pela França. Uma declaração candente da jovem Axelle Lemaire, ministra da França para a “área digital”, ameaça a harmonia dentro do Comitê Governamental Consultivo (GAC) e sua relação com a Icann.

Após a batalha pela reserva do domínio “.amazon”, em que a Icann acatou o aconselhamento do GAC e não seguiu repassando o domínio para a conhecida empresa norte-americana, novos embates se prenunciam.

O motivo desta tensão vem da criação da Icann, em 1998, como uma organização sem fins lucrativos, estabelecida na Califórnia (EUA), e que assumiu a coordenação da raiz da estrutura de nomes da Internet (DNS) e a distribuição de números IP, funções que eram exercidas pela Autoridade para Atribuição de Números na Internet (Iana), sediada na Universidade da Califórnia do Sul (USC) e liderada pelo pioneiro Jon Postel, que faleceu em 1998.

O período de 1995 a 2000 gerou um legado complexo para a Internet. A nascente atividade de registro de nomes de domínio de forma comercial, inaugurada em 1996 quando “.com”, “.net” e “.org” deixaram de ser grátis e passaram a ser geridos por uma empresa, a Network Solutions, atiçou o apetite dos que viam nesse segmento um promissor negócio.

A raiz de nomes de domínio ficou praticamente sem alteração por décadas, constituindo-se dos três citados acima (os genéricos) mais um por código de país, como “.ar”, “.br”, “.de” e outros, totalizando menos de 300. Há dois anos, a Icann aprovou a entrada de novos domínios genéricos na raiz de nomes e esses 300 passarão em breve a ser mais de 2 mil! E há pedidos para tudo: nomes genéricos como “.wine”, marcas como “.amazon”, nomes de cidades como “.berlin”, todos com seu potencial de conflito com estruturas existentes, sem falar da confusão que podem trazer ao internauta. E os governos, representados dentro do GAC, têm opiniões fortes a respeito.

Dentre o leque de atividades que lhe coube ao assumir a Iana, a Icann escolheu dedicar-se quase que exclusivamente a definir a forma de aumentar a raiz de nomes. As reações começam e podem ser bastante duras. Em tempos mais amenos, em março de 1994, Jon Postel, que além de engenheiro era sábio, escreveu no RFC (documento que descreve padrões de protocolos de Internet) 1591 a descrição do que se esperaria encontrar na raiz de nomes: “No Sistema de Nomes de Domínio (DNS) há uma hierarquia de nomes (…) Existem nomes genéricos como “.edu”, “.com”, “.net”, “.org”, “.gov”. “.min” e “.int” e nomes de duas letras que provêm da tabela de código de países, a ISO-3166. É extremamente improvável que outros nomes de domínio sejam criados na raiz.”

As coisas mudaram e não temos mais a avaliação segura de Postel para ajudar.

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https://www.estadao.com.br/link/demi-getschko-a-internet-e-seu-desaparecimento-adiado/

segunda-feira, 16 de junho de 2014

A Internet e seu desaparecimento adiado

Em 2001 me perguntaram qual seria o futuro da Internet. Respondi que para a Internet ser realmente bem-sucedida, ela deveria “sumir” – no sentido de que se tornaria invisível aos seus usuários. Algo do dia a dia, com o qual contaríamos automaticamente e ao qual não prestaríamos nenhuma atenção específica.

A Internet estaria oculta sob as numerosas aplicações bem-sucedidas, da mesma forma que a eletricidade está sob os eletrodomésticos, de forma automática, sorrateira e confiável. Sem saber, estava plagiando o cientista Mark Weiser (autor do conceito de computação ubíqua), que em 1991 havia escrito que “as mais profundas tecnologias são aquelas que desaparecem, que se mesclam ao tecido do dia a dia até dele se tornarem indistinguíveis”.Há hoje, entretanto, uma “pedra no meio do caminho” do apregoado e saudável desaparecimento da Internet. É uma urgência técnica à qual devemos atentar: a migração do IPv4 para o IPv6. Explico: o IPv4 é a versão atual do protocolo básico da rede IP (Internet Protocol), sua língua-mãe. O IPv4 vem com uma numeração que permite “apenas” quatro bilhões de “habitantes” na rede. Pode parecer muito (e talvez parecesse à época, quando os engenheiros Vinton Cerf e Bob Kahn definiram o tamanho e formato do endereço IP), mas é insuficiente para o número de usuários e máquinas da rede de hoje.

A saída é o IPv6. A nova versão do IP terá um número impronunciavelmente maior de elementos conectáveis. O IPv6 permitirá que cada um de nós ligue milhões de equipamentos à rede: será a nova alvorada da Internet, agora como a “rede das coisas”. Assim (e esperamos que pela última vez), teremos que prestar atenção técnica à Internet e a ela dar o tratamento necessário. Mal comparando, seria como trocar o “padrão de tomadas”.

O estoque de IPv4 destinado às regiões do mundo se esgota. Acabou na Ásia há três anos, e na Europa há um ano e meio. Agora foi a vez da América Latina e Caribe. Como sempre, quem está na “região de conforto” usando IPv4 e sem necessidades expressivas de crescimento não dá atenção a providências que não parecem afetá-lo imediatamente.

Mas aqueles que não prestarem atenção ao fim do IPv4 cometerão um erro que pode custar muito caro, tanto em termos de solidez e crescimento da rede, como em termos de novas aplicações e conexões. Ninguém, ao construir casa nova, usaria tomadas do padrão antigo – seria algo totalmente sem sentido. A Internet recria-se a cada instante. Precisa de padrões sólidos e que suportem sua expansão, não de meros adaptadores que prolonguem seu uso sem segurança.

Em suas compras de equipamentos, certifique-se de que eles aceitam IPv6. Fale com seu provedor de acesso sobre a disponibilidade e estimule os serviços que você mais usa na rede para que também sejam acessíveis com o protocolo IPv6. Vida longa à Internet!


DEMI GETSCHKO ESTREIA HOJE COMO COLUNISTA QUINZENAL DO 'LINK'. PERSONAGEM CENTRAL NA HISTÓRIA DA INTERNET NO BRASIL, JÁ FOI DIRETOR DE TECNOLOGIA DA AGÊNCIA ESTADO, EMPRESA DO GRUPO ESTADO, E POR DOIS PERÍODOS DIRETOR DA ICANN, ENTIDADE AMERICANA RESPONSÁVEL PELA GESTÃO DE ENDEREÇOS DA WEB E NÚMEROS IP. DESDE 1995, É CONSELHEIRO DO COMITÊ GESTOR DA INTERNET (CGI.BR).

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https://link.estadao.com.br/noticias/geral,demi-getschko-a-internet-e-seu-desaparecimento-adiado,10000031121
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http://www.provider-tech.com/index.php?route=pavblog/blog&id=11
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