terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Fênices na tecnologia

É curioso observar, no vórtice de evolução tecnológica em que vivemos, a alternância de tendências e dos modismos. Ao sabor do que é mais impactante mercadologicamente, e qual a mitológica fênix, conceitos algo esquecidos são reciclados e revividos, quando a roda da tecnologia volta a lhes dar fôlego. Inteligência Artificial, em seus quase 70 anos de existência, passou por diversos “invernos” durante os quais sua popularidade caiu, mas hoje, graças às capacidades de processamento e armazenamento, é o tema mais quente. Há que se descontar as extrapolações que, indiscriminadamente, aplicam a etiqueta IA em tudo.

Só pra recordar temas dormentes - mas que podem reviver de um momento a outro - a discretização do digital tem como alternativas computadores analógicos. Do mesmo modo que há espaço para a “lógica difusa” (fuzzy) além da lógica binária fixa. Afinal o cérebro humano tem um funcionamento analógico, mais associado a eventos químicos e elétricos que a eventos binários. Essa era a abordagem das “redes neurais”, ao simularem formas de simulação do aprendizado que acontece com as conexões e sinapses neuronais em nossos miolos.

O maciço poder que a computação tradicional desenvolveu, manteve-a como principal simulador, em lógica discreta, de eventos que seriam mais apropriadamente tratados como analógicos. Mas isso não preclude a cíclica retomada de linhas antes abandonadas ou menos estimuladas. Notícia desta semana, por exemplo, apregoa que um supercomputador, usando redes neurais e a ser lançado em abril do ano que vem, conseguirá atingir a capacidade humana em termos de conexões neuronais. O DeepSouth, em desenvolvimento por equipe australiana e alemã, alega que realizará mais de 200 trilhões de operações sinápticas por segundo, rivalizando com o que o cérebro humano consegue. E há ainda um ponto muito importante nos dias de hoje: o consumo de energia do DeepSouth, por usar plataforma diversa da dos supercomputadores convencionais, deve ser muito menor do que o destes.

Enquanto aguarda-se a comprovação desses números, alguns dos pontos de debate hoje poderão ser recalibrados. Afinal, adotando-se um esquema de rede neuronal com aprendizagem não supervisionada, estamos criando algo que aprende de forma muito próxima à nossa. Revisitaríamos a discussão que temos hoje sobre “ética da IA”? Indo “além das sandálias”, arrisco-me a dizer que é uma saida simplória bradar por ética sem definirmos a priori o que queremos que IA entenda por isso. Arrisco-me a dizer que nós mesmo usamos “ética” como uma platitude que não gerará reação adversa, mas sem nos darmos ao difícil trabalho de definir o que esperamos com isso. Afinal, cada um quer da IA a ética que a ele próprio parecer adequada...

E com isso termina o último texto do ano. Pegando carona com Mário Quintana, “quando se vê, já são seis horas! / quando se vê, já é sexta-feira! / quando se vê, já é Natal.../ quando se vê, já terminou o ano…”. Obrigado, bom Natal a todos, e um excelente 2014!

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O anúncio do DeepSouth:

https://www.westernsydney.edu.au/newscentre/news_centre/more_news_stories/
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Textos sobre 'lógica difusa" e computadores analógicos
https://en.wikipedia.org/wiki/Fuzzy_logic
https://en.wikipedia.org/wiki/Analog_computer
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O poema de Mário Quintana:
https://manoelafonso.com.br/politica/o-tempo-mario-quintana-2/

A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando de vê, já é sexta-feira!
Quando se vê, já é Natal…
Quando se vê, já terminou o ano…
Quando se vê perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê passaram 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado…
Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas…
Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo…
E tem mais: não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo.
Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz.
A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará.

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Fênix:
https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%A9nix



Imagem da Fénix renascendo, do "Bestiário de Aberdeen"


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