terça-feira, 3 de abril de 2018

O Poder da Escolha

Eventos recentes mostraram o quão vulneráveis e expostas na internet são as informações sobre nossas características. Eles aumentaram a sensação de que estamos expostos à manipulação. São tempos fluidos, em que a ânsia de buscar ancorar em algum porto, que nos dê segurança e solidez, muitas vezes apenas aumenta a instabilidade da embarcação, que segue a destino obscuro.

O vazamento de dados na internet traz à discussão o papel dos intermediários e das plataformas. É óbvio que tudo o que nos oferecem prevê contrapartida – afinal trata-se de iniciativas que visam retorno e lucro. Essa contrapartida pode ser abusiva, quando viola preceitos legais, ou apenas oportunista. Para evitar contrapartidas legalmente abusivas há que se lutar por mais clareza na proteção de nossos valores, do que não é passível de escambo; mas tratemos aqui apenas das oportunistas.

É sabido que poucos leem os termos dos “contratos virtuais” ao aceitar as “regras do clube” e, mesmo que não sejam regras dentro do que a lei permite, alegremente dão sua aprovação e partem para o uso. Escrevem, ouvem, falam, criam círculos de amigos que muitas vezes nem são reais ou, se o forem, nunca serão encontrados ao vivo, comentam notícias verdadeiras e falsas dando seu apoio ou rejeição, às vezes discretamente, muitas vêzes enfaticamente. Ora, não é preciso ser bidu para imaginar que, com a capacidade de computação a baixo custo que temos, mesmo que nada seja formalmente “abusado” pode-se levantar detalhadamente um perfil. E se for de interesse do explorador, ele pode mandar mensagens que saberão vibrar a corda certa do usuário, que responderá entusiasticamente à engenhosa maquinação.

Quando se mostram resultados dessas varreduras, corre-se a trancar portas arrombadas. Para tornar o cenário pior, tenta-se erigir a plataforma num Catão moderno, que julgará o que pode ou não ser publicado. O que era para ser apenas um intermediário, torna-se um tutor. Claro que a plataforma alegará que “é difícil fazer o que vocês pedem” mas, em seu íntimo, ela se rejubila porque ganhou poder: examinará o que nela colocamos, e sancionará  o conteúdo. Foi elevada a um patamar que não tinha.

Não creio que este seja um caminho promissor. Pessoalmente, preferiria plataformas mecânicas e “burras”, responsabilizando diretamente aqueles que as usaram pelo mal causado. Há certamente casos em que a plataforma não é nada ingênua, e faz parte de sua estratégia a manipulação dos dados de seus usuários, e estaríamos em um estado avançado de deterioração. Mas mesmo em casos em que não há flagrante e ilegal abuso, persiste a leviandade com que tentamos nos eximir, da falta de uma maior temperança ao nos manifestarmos, a imersão no mar de futricas em que estamos gaiatamente nadando.

Laboramos em nosso desfavor ao pedirmos às plataformas que supram o que deveria estar acima delas: que apaguem coisas de que não gostamos, que desliguem usuários apenas por deles discordarmos. Há, é claro, regras de conduta a serem seguidas e que podem levar a sanção de usuários, mas esse cenário deveria ser estático e não dependente do calor momento. Como disse Joseph Reagle, “na internet, seu clique é seu voto”: afinal quantos ambientes já não sumiram por falta de cliques? Temos o voto - votemos certo!

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